segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Capítulo 9-Tritões tem namoradas - Parte 2


No dia seguinte, o Guto não quis falar com nenhum de nós. Ele tava mesmo bolado com aquele negócio da Teresa. Já ela, não queria vê-lo nem pintado de ouro. Guto tentou umas vezes falar com ela, mas foi inutil.


Resolvi passar o recreio sozinho pra pensar. É muito ruim ver nosso grupo se desfazendo. Eu precisava fazer o Guto voltar com a gente.


-Tá tudo bem, Pedro? - Uma voz ecoou ao meu lado.


Quando ergui a cabeça, meu mundo todo se iluminou. A tristeza passou, a angustia foi embora, dando lugar apenas para o conforto e felicidade. Lúcia estava bem ao meu lado, com os lindos olhos olhando inquisitivos para mim. Ela se sentou ao meu lado e falei a ela tudo que estava rolando.


-Promete que não fala pra ninguém?


-Claro, claro, juro. Minha boca é um tumulo enterrado a sete palmos de terra. - Ela disse, rindo depois. Meu Deus, ela é tão linda... Eu sentia um impulso de pegá-la nos braços e abraça-la ali mesmo. Ela era tão magrinha, tão fragil, com aqueles cabelos cor de mel, mais parecia uma boneca. -Mas foi meio errado o que o Guto fez, não foi? - Ela falou, interrompendo meus pensamentos.


-É, com certeza. Mas eu conheço ele, apesar de ser meio doido, o Guto gosta mesmo da Teresa. - Falei. Lúcia concordou com a cabeça. Ficamos um momento em silêncio. Ah, ficar em silêncio ao lado dela era a melhor coisa que havia lá. Depois, ela me contou que iria ao shopping Iguatemi junto da Teresa e do Davi. GRRR!! "Se o Davi ousar encostar os dedos deles na Lúcia..." pensei.


Depois de minha conversa com a Lucia, reuni a turma e armamos um plano.


Assim que a aula acabou, fomos para a praia. Ficamos nadando pelos corais, esperando que Guto aparecesse. Foram dias estressantes pra ele, com certeza estaria nadando por ali em algum coral. E o encontramos. Estava nadando tranquilamente com sua armadura de turmalina e com sua cauda de boto-cor-de-rosa, que balançava tristemente pela água esverdeada. Nadamos até ele. Mas, assim que nos viu, ele esquivou-se e nadou mais rapido. Acançamos ele e ficamos na sua frente, impedindo que passasse.


"Não vamos te deixar ir até nos ouvir. " Falei. Nós agora podiamos "falar" debaixo d'água, depois que recebos poderes maiores com os muiraquitãs. Na verdade, não era bem falar, e sim um eco da nossa voz se propagava pelo espaço. Era como falar em voz alta mas sem mover os lábios ou abrir a boca.


"Dá pra sair da minha frente, porra?" Guto pensou, olhando feio pra nós.


"Não, porra. Não vamos sair não, porra! " Norato falou, cruzando os braços.


"A gente tem muito pra falar contigo, porra!" Samuel falou. Guto cedeu e relaxou.


"Nós não falamos pra Teresa o que você fez. " Falei.


"Então quem foi?'" Ele perguntou.


"O Davi!" Samu, Rato e eu respondemos juntos. Guto ficou imovel por um momento. Ele estava começando a pensar que era mentira nossa, mas, conhecendo o dito cujo, já sacou de que lado estava a verdade.


"Aquele filho da vaca!!" Ele gritou.


"É, nem me fala!" Concordou Norato.


"Onde é que ele tá agora?" Guto perguntou.


"No Iguatemi, mas é melhor... " Guto saiu em disparada, não me ouvindo completamente "... Irmos contigo." Falei.


"Vamos atrás dele! " Samuel disse, começando a nadar. Nós chegamos ao shopping, junto de Guto. Procuramos por Teresa, Lucia e Davi. Ainda bem que era dia de semana e havia pouca gente.


Finalmente os encontramos, Lucia e Teresa estavam na Renner junto do loiro tingido. Guto foi falar com Teresa, que teimava em não querer papo. Eu tive meus olhos apenas para Lucia, que estava linda com um vestidinho curto e todo florido.

-Eu já disse que não quero papo! - Teresa disse, parecendo estressada. Ela combina mesmo com o Guto. Os dois esquentadinhos da turma.


-Licença, meu irmão, a moça disse que não quer falar contigo. - Davi entrou no meio, dando uma de herói, o que com toda certeza ele não era.


-Tu não tem nada que se meter entre a gente, rapá. Isso é um assunto meu e dela. - Guto disse.


-Ai, meu Deus... - Teresa resmungou, pondo a mão no rosto. - Gente, que mico vocês tão fazendo! - Ela se juntou a Lúcia e sussurrou algo a ela. Coisa de menina.


Olhei para os lados e vi que muitas senhoras estavam mesmo de olho na gente. Os atendentes já olhavam de soslaio, preparando-se para nos expulsar da loja.


"É melhor nos apressarmos com isso. Tô com um mal pressentimento..." Samuel pensou, olhando pros lados incessantemente. Quando eu já ia perguntar o que era, o destino respondeu por mim. Um barulho de bala. E dois caras com meias pretas na cara apareceram na frente da loja, anunciando assalto pra todos. Teresa soltou um gritinho, Davi ficou se tremendo todo dentro das calças, Lucia se agarrou a mim e nós quatro ficamos sem reação.


"Aaaahhh... Mamããee..." ouvi os pensamentos de Davi. Se eu também não estivesse tenso com aquilo, teria caido de rir. Os assaltantes mal encarados foram até o caixa e disseram algo tipo


-Passa o dinheiro todo, porra! Mais rápido! Vambora, porra!!-


Tive uma ideia. Nós iriamos passar sorrateiramente pelos assaltantes, sair pela porta e chamar a polícia. Falei isso ao pessoal.


-Não, é muito arriscado, e ainda tem um na porta. - Samuel sussurrou.


-Espera! Tem uma outra porta do outro lado da loja, que dá direto pro outro lado do shopping. -Lúcia sussurrou. Quase cai de susto quando vi Davi deixar nossa rodinha e sair correndo em disparada para o outro lado da loja. O cara corria e gritava, mais parecendo uma avestruz fugindo de um guepardo.


-Onde é que tu pensa que vai, viadinho?! Pega ele, Juí! - O assaltante chefe gritou, e o outro correu atrás de Davi.


-Davi! Avisa pra policia!! - Teresa gritou.


-Eu não! Vou é me mandaaaaarr!!! - Ele esperneoou, conseguindo fugir da loja. Mas antes que fizessemos o mesmo, o assaltante chefe pegou Teresa pelo pescoço, pôs o braço ao redor dele e apontou a arma para sua cabeça. Meu Deus, fiquei apavorado. O Guto estava suando frio, a Lucia chorava de pavor, pondo as mãos na boca.


-Avança um passo e eu estouro a cara da burguesinha aqui. - O assaltante falou. A pobre Teresa chorava de medo. Caramba, nunca estive numa situação dessa! O que a gente ia fazer? - Todo mundo pros provadores, vambora! Vambora! - Ele ordenou. Todos juntos, fomos até os provadores. Ai, chegaram mais assaltantes, mais uns três e se juntaram ao líder. Ficaram sussurrando alguma coisa a ele, como se armassem um plano. Todos tinham pistolas na mão, super carregadas de bala. O chefe soltou Teresa, que instintivamente agarrou-se a Guto. Ela soluçava e chorava sem parar. Guto agarrou-a com seus braços fortes e Lucia pôs a mão no ombro da amiga.


-Calma. Calma. Vai dar tudo certo. A gente vai sair dessa. - Ele sussurrou.


-Será? - Norato duvidou. Olhamos para ele, com cara de "Cê não tá ajudando." - Tá, malz aê.


-Pedro, tive uma ideia. E se a gente chamasse a policia pelos celulares? - Samuel propôs.


-Não, é muito arriscado, eles podem nos ver... - Então, me veio a mais brilhante ideia. Samuel olhou pra mim e sorriu, tendo o mesmo pensamento que eu. Olhei para Norato e Guto, e eles também entenderam a mensagem. Nós quatro começamos a cantar "Só Hoje" do Jota Quest.


"Hoje eu preciso ouvir, qualquer palavra tua, qualquer frase exagerada que me faça sentir alegria em estar vivo..."


No mesmo momento, as meninas pararam de chorar e nos observaram, boquiabertas. Os assaltantes pararam o que estavam fazendo e olharam para trás. Até as mulheres caídas no chão de dentro da loja se levantaram para nos ouvir.


"Hoje eu preciso tomar o café, ouvindo você suspirar, dizendo que eu sou o causador da tua insônia, que eu faço tudo errado sempre... Sempre..."


Fomos andando, começando a sair, agarrados às meninas, dos provadores. Os assaltantes nos deixaram passar numa boa, inteiramente hipnotizados pelas nossas vozes. E quando finalmente chegamos ao refrão, todos pararam para ouvir.


"Hoje... Preciso de você... Com qualquer humor, com qualquer sorriso..."


Fomos andando lentamente até a porta de trás. Ninguém nos impediu. Percebi que haviam assaltantes do lado na porta, e que a polícia já estava do lado de fora, tramando troca de reféns.


"Hoje... Só tua presença, vai me deixar feliz... Só hoje..."


E saimos correndo da loja, abrindo a porta rapidamente. Nesse exato momento, a policia entrou e gritou -MÃOS PARA O ALTO!- Prendendo por fim todos os assaltantes.


Assim que saímos, os policiais nos interrogaram. Deixei o trabalho de responder as perguntas pro Samuel, ele conseguiria persuardir um pouco a história. Olhei pro canto, e vi Guto ainda abraçado com a Teresa. Ele sussurrou algo pra ela.


-Gustavo... Você me salvou? - Ela perguntou.


-Acho que sim, né?- Ele respondeu, sorrindo para ela. Lucia se aproximou de mim e assistiu a cena também. - Fiz isso porque você é muito preciosa pra mim. - Guto falou, passando a mão de leve no rosto dela. Teresa pareceu que ia ceder. Mas olhou pro lado, fazendo seu longo cabelo amarronzado cair sobre o rosto.


-Mas isso não muda o que você fez. - Ela disse, ainda irredutivel. Guto pegou suas mãos. E, para a minha surpresa e a de todos, ele se ajoelhou.


-Acredita em mim, eu sinto muito mesmo pelo que te fiz. Prometo por tudo que há de mais sagrado que você vai ser a única pra mim agora. E sempre. - Ele falou. Olhei pro lado e vi Lucia chorando. Já não contive minha emoção. Pus o braço ao redor de sua cintura, consolando-a.


-Ela tem tanta sorte. Ele gosta mesmo dela. - Ela disse, olhando pra mim e sorrindo, feliz pela amiga. "Se você soubesse que eu poderia fazer isso e muito mais por você..." pensei.


-Senti muito a sua falta. - Guto falou. Teresa não pode conter. Ela pulou sobre Guto.


-Também senti. - Ela disse. E, no fim, acabaram dando um beijo apaixonado, selando algo que parecia eterno, sem nenhuma interrupção.


Por fim, tudo ocorreu bem. Quando cheguei em casa, mamãe me abraçou forte, e me perguntou tudo que ocorrera. Até o Ricardinho me abraçou, preocupado comigo.


No dia seguinte, nós quatro nos reunimos nos bancos atrás da quadra e botamos papo para o ar, como sempre faziamos.


Nenhum comentário:

Postar um comentário