Quem me conhece sabe que não sou de desistir facil. Então, arrastei Guto até os bancos atrás da quadra.
-Mano, sinceridade, cê acha que vale a pena? O moleque mermo disse que não quer papo com a gente. - Ele falou, cheio de suas girias.
-Eu sei. Mas ele é um tritão como nós. E o que tem demais nós sermos amigos dele? - Argumentei.
-Pedro, macho, o moleque não quer falar com a gente! Pra que insistir nisso, caramba? - Guto exclamou, gesticulando com os braços.
-Porque nós três somos ligados de alguma forma. Eu sinto... Não. Eu SEI que nós devemos ficar juntos dele. Nós somos como irmãos, farinha do mesmo saco. - Respondi. Guto calou-se e revirou os olhos.
Fomos até os bancos e vimos Norato. Ele estava com um casaco azul sobre a farda, o capuz do casaco escondendo seu rosto. Ele balançava a cabeça freneticamente. Devia estar ouvindo música no MP3.
-O que ele tá ouvindo? - Perguntei. Guto concentrou-se e usou seus poderes sonoros para dar um "zoom" no som. Depois sorriu e sacudiu os ombros.
-O cara tem bom gosto! Crank That do Soulja Boy! Mandou bem moleque! - Guto falou, mas Norato parecia não ter ouvido.
-Err... Norato? - Chamei-o. Sem resposta.
-Deixa comigo. -Guto disse. Ele agachou-se, endireitou a coluna e mandou ver. - NORAAAAAAAAAAAAAAAAAAATOOOOOOOOOO!!
Norato caiu do banco, do tamanho do susto que levou. Todo mundo do colégio olhou para nossa direção, revirando os olhos. E eu fiquei mais rosa que o vestido da Geyse Arruda.
-Diz, mano. Viemos trocar um papo contigo. -Guto disse. Norato tirou o capuz do rosto, os fones dos ouvidos e olhou pra baixo.
-Gente, eu já falei pra vocês. Não posso...
-Cara, você quer ser nosso amigo. Só não é por causa da sua irmã. - Falei. Norato calou-se e coçou a parte de trás da cabeça.
-Eu ia te mostrar um negócio. - Tirei do meu bolso meu Nintendo DS novo que Mamãe me dera de Natal - Cê gosta de videogame?
Os olhos de Norato brilharam como os de uma criança.
-Um Nintendo DS!! Não acredito que você tem ! - Ele disse.
-Acho que sim. - Respondi a mim mesmo.
-Caramba, Nintendo DS?! Man, tu podendo me deixar jogar... - Guto reclamou.
Norato pegou o Nintendo e entrou nos jogos de corrida de carro. O moleque se garante muito! Ficamos um tempão jogando junto dele. Até que ouvimos um barulho estranho de água e uma moça apareceu do nada.
Ela era ESPLENDOROSA! Quer saber a definição de gostosa? É só olhar pra ela. Ela tinha um corpo curvilineo perfeito, cabelos negros cacheados caídos sobre os ombros, além de uns lábios de deixar qualquer um louco. Ela tirou os óculos escuros e... Caraca! Era a sereia que estava nadando com o Norato!
-Oi, maninho. Arranjou novos amigos? - Ela perguntou, trincando os dentes ao dizer a palavra "amigos". "Ela é irmã dele? Legaal..." Guto pensou. Dei-lhe uma cotovelada discreta.
-Maria, eles são... - Norato começou, ficando em pé junto da irmã como se ela fosse um sargento do exército.
-Pedro e Guto, prazer. - Eu falei por ele, estendendo minha mão para cumprimentá-la. Maria mexeu a mão apenas para ajeitar os cabelos volumosos. Depois, voltou o pescoço lentamente para Norato.
-O que eu "pensei" sobre não se aproximar deles? - Ela vociferou no ouvido do irmão, fazendo questão que nós ouvissemos com clareza. Ele se encolheu como um condenado. Como ela podia fazer isso? Tá que irmãos mais novos enchem muito o saco ( experiencia própria),mas... Meu Deus. Maria deu um passo a frente, me encarando.
-Escuta aqui. Vocês parecem ser muito bonzinhos. Mas eu e meu irmão não precisamos de outros de nossa espécie. Então, não se metam com a gente. - Ela disse.
-Olha, vocês parecem ser muito unidos e tudo, mas... Nós também podemos ser seus amigos, se você deixasse, nós dois... - Eu comecei, mas parei assim que vi Maria estender a mão e uma bola de água aparecer no ar. Ela iria jogar aquilo em mim.
-Eu já disse... - Ela agarrou Norato pelo braço - ... Que não. - E lançou a água na minha cara.
Cambaleei para trás e cai sentado no banco. Não demorou muito para que o turbilhão de água aparecesse e transformasse minhas pernas na minha enorme cauda preta e verde. Guto avançou um passo, pronto para dizer umas poucas e boas para Maria, mas ela fez outro gesto e a poça d'água que se formara começou a flutuar e a cobriu. Em poucos segundos, ela e Norato haviam desaparecido.
Tirando a atenção disso, Guto virou-se para mim, e tentou secar minha cauda com a farda. Mas, para meu maior desespero, o sinal do final do recreio tocou. Vociferei um palavrão.
-Relaxa, relaxa, apenas assobia. - Guto falou. Fiz uma cara de "??".
-Como é que é?
-Assobia, caramba! Anda, faz isso! - Guto me apressou. Fiz o que ele mandou e soltei um assobio melódico. De repente, um pequeno redemoinho de vento apareceu e começou a circular ao redor da minha cauda, secando-a em poucos segundos. "Uau" sussurrei.
-Podemos fazer isso? - Perguntei. Guto fez novamente sua cara de "DÃÃ!"
-Claro, né! Cê nunca secou sua cauda assim?
-Err...
-Ah, esquece. Simbora, a aula vai começar.
Corremos para a sala de aula. Olhei para a carteira em frente à minha e vi que todas as coisas de Norato haviam desaparecido junto dele. Suspirei pesaroso. O resto do pessoal (principalmente as meninas) perguntava se ele havia gazeado aula. Eu e Guto respondiamos que ele havia se sentido mal e que a irmã dele o levara pra casa.
Sinceridade, agora que conheci a irmã dele, as coisas vão complicar. Mas sei que Norato quer ser nosso amigo. E já é. Nós vamos lhe mostrar que ele tem vida própria. Só não sei como.
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